Petrúcio Ferreira: do futsal à glória da falta dos limites de velocidade
Mesmo com todas as conquistas e recordes, aos 28 anos, ele vai em busca do tricampeonato paralímpico, em Paris
Vitória Soares
24 de fevereiro de 2024

Petrúcio Ferreira está se preparando para disputar a sua terceira Paralimpíada, que será em Paris, na França, durante o mês de agosto deste ano. Mesmo com todas as conquistas em mundiais, Jogos Parapan e Paralímpicos, o paraibano sempre deixa a impressão de que ainda não alcançou o seu limite. Aos 28 anos, ele vai em busca do tricampeonato nos 100m da categoria T47 (para atletas com deficiências nos membros superiores) e de se manter no topo do paratletismo mundial.

Ao longo da sua vida, Petrúcio nunca viu limites para correr atrás dos seus sonhos. Aos dois anos, ele perdeu uma parte do seu braço esquerdo em uma máquina moedora de capim. Apesar disso, ele e sua família nunca deixaram acreditar que tudo estava acabado, mesmo com as dificuldades que eles enfrentavam. E foi o esporte que chegou até São José do Brejo do Cruz, no Sertão da Paraíba, e deu a esperança de que as coisas poderiam mudar.

Descoberto pelo atletismo através do futsal

Petrúcio sempre teve o sonho de, por meio do futebol, representar o seu país. Só que o seu talento era mesmo para o atletismo. Durante os Jogos Escolares da Paraíba, em 2013, a velocidade do bicampeão mundial chamou a atenção de um dos organizadores do evento. Foi neste momento que o atletismo o escolheu. 

“Na verdade, eu fui descoberto para o atletismo quando eu estava jogando futsal. Um dos organizadores dos Jogos Escolares da Paraíba me viu jogar o futsal e viu que eu tinha muita explosão em quadra, velocidade. Então, surgiu a curiosidade do por que eu não estar inscrito no atletismo. Na época, o meu treinador conversou com o meu professor do colégio para me inscrever no atletismo”, explicou.  

Petrúcio Ferreira bateu recorde mundial com 10s42 nos 100M T47, no Mundial de Atletismo em Dubai. (Foto: Ale Cabral/CPB)

A sua rapidez nas corridas se refletiu nos resultados. Mesmo ainda “cru” na modalidade, Petrúcio começou a se destacar nas provas. O talento era tanto, que, em menos de um ano, foi convocado para representar o Brasil. 

“Nas minhas primeiras competições, já consegui me destacar e ser primeiro nas provas dos 100 metros. Em 2014, já recebi minha primeira convocação, mesmo sem treinar nada com o atletismo. Só corria o que sabia correr, com o que aprendi jogando futebol, brincando no sítio”, disse.  

Mudança para João Pessoa 

Para seguir o seu sonho, Petrúcio precisou abrir mão de muitas coisas. Uma delas foi ter que sair do sítio onde morava com a família em São José do Brejo Cruz e ir se mudar de forma definitiva para João Pessoa. 

Ele se mudou para a capital paraibana apenas com o seu sonho, já que, por conta das condições financeiras da sua família, o futuro bicampeão paralímpico não sabia onde ficaria e nem como se manteria em uma cidade desconhecida. Até que ele conheceu aquela que se tornaria a sua segunda família. 

“Quando vim embora para João Pessoa, eu não tinha onde ficar e não tinha financeiro para me manter. Nisso, uma família que é de uma ex-prefeita (Dona Natividade) lá da minha cidade e que mora em João Pessoa, me acolheu na casa deles. Quando souberam da minha história, que eu tinha me destacado no atletismo, estava recebendo uma convocação e queria vir embora para João Pessoa para começar a treinar. Eles me acolheram na casa deles. Hoje, eu tenho o pessoal dessa família, como a minha família também, da forma que eles me acolheram, da forma que eles me trataram, me apoiaram. Em alguns momentos que eu não tinha condições de comprar alguma coisa, eles iam lá e faziam vaquinha, me ajudavam para comprar, para me incentivar no esporte e nos estudos”, lembrou.  

Parceria de sucesso com técnico Pedrinho

Por trás de todo o sucesso dentro das pistas, Petrúcio tem um grande parceiro, o seu técnico Pedro de Almeida Pereira, conhecido como Pedrinho. Essa parceria, inclusive, completa 10 anos neste sábado (24), que foram vividos com intensidade, vitórias e boas histórias para contar.

Juntos, os dois conquistaram cinco medalhas paralímpicas, sete nos Jogos Parapan-Americanos e quatro em mundiais. Para Petrúcio, essa relação com Pedrinho não é apenas entre atleta e treinador. Na verdade, é de pai e filho.

“Para mim, ele é meu segundo pai. Trabalhar com ele é uma satisfação enorme. A alegria que ele transborda com seus atletas, a paixão que ele tem pelo que faz, de se dedicar todos os dias, abdicando de algumas coisas, estar longe da família, se dedicando aos seus outros filhos, que são os atletas…”, contou.

Petrúcio Ferreira e o técnico Pedrinho completam 10 anos de parceria neste sábado (Foto: Ale Cabral/CPB)

O velocista paraibano chegou a receber outras propostas para treinar em outros lugares, mas ele não queria que essa parceria acabasse.

“Será que se eu fosse embora, eu ia encontrar um treinador que nem o Pedrinho, que é um cara alegre, que se diverte, que se preocupa com o seu atleta? Como ele sempre fala, ele não só trabalha o atleta, ele trabalha a pessoa por trás do atleta. Porque, algumas vezes, as pessoas veem o atleta como uma máquina, que está preparado para treinar e competir, seguir uma rotina. Mas o atleta tem uma vida por trás da sua carreira, uma vida pessoal. Por isso que os meus resultados vem rendendo até hoje”, revelou Petrúcio.

Conquistas 

Em 10 anos de atletismo, Petrúcio acumula medalhas e recordes, sendo o atleta paralímpico mais rápido do mundo. O paraibano é bicampeão paralímpico (2016 e 2020) , tetracampeão mundial (2017 e 2019) e pentacampeão parapan-americano (2015, 2019 e 2023). Além disso, ele também tem duas medalhas de prata paralímpicas nos 400m e revezamento 4x100m misto, no Rio, em 2016; um bronze conquistado nos 400m, em Tóquio 2020; e uma prata no Parapan de Santiago 2023, no revezamento 4x100m misto. 

O velocista ainda é o atual recordista mundial dos 100m na classe T47, com o tempo de 10s29. 

Petrúcio Ferreira bateu o recorde mundial dos 100m durante um desafio da CPB e CBAt, em 2022 (Foto: Marcello Zambrana/CPB)

Todas essas conquistas se tornam coadjuvantes quando Petrúcio conta o que já conseguiu proporcionar à sua família por meio do esporte, quando ainda era adolescente. Aos 17 anos, ele conseguiu comprar uma casa para os seus pais. Enquanto morava em um quarto, na capital paraibana, o atleta juntava o dinheiro que ganhou dos patrocínios e do Bolsa Esporte para as Paralímpiadas do Rio, para poder garantir uma moradia para a sua família no Sertão paraibano.

“Quando comecei no atletismo, eu tinha esse objetivo de não só de representar o meu país, mas de representar a minha família, de dar uma condição melhor para meu pai, minha mãe, que sempre batalharam para botar o pão na mesa. Mesmo em momentos difíceis que a gente enfrentava morando no sítio, eles nunca desanimaram. E o esporte, aos poucos, foi me proporcionando essas situações, de dar a primeira casa para o meu pai, de dar o primeiro transporte aos meus pais. E foi em uma das conquistas maiores, mais recentes, que está com cinco anos, é que eu consegui comprar um sítio para a minha família. Meu pai, que nasceu e se criou no sítio, não queria ir embora para a cidade, apesar de eu ter comprado casa na cidade, e eu consegui comprar um sítio para meus pais. Então, para mim, foi uma grande conquista que o esporte me deu, foi poder ajudar a minha família”, contou.

Preparação mental

Para se manter no mais alto rendimento, Petrúcio não deixa de cuidar de sua saúde mental. Desde o início de sua carreira, ele busca se preparar para os momentos de pressão que as competições acabam exigindo e para os de desgaste, por conta da rotina intensa de treinamento. 

E uma das formas que ele usa para se concentrar antes das provas é com o seu jeito brincalhão. 

“Eu tenho alguns medos, sou ansioso. Mas sempre busco me controlar o máximo possível em cima dessas situações, fazendo alguns trabalhos mentais para chegar bem na competição. Uma das formas que eu tenho de me concentrar é brincando de frente às câmeras, brincar com os adversários, de uma forma respeitosa, e interagir com o público”, revelou.

Petrúcio Ferreira nos Jogos Paralímpicos de Tóquio 2020 (Foto: Wander Roberto/CPB @wander_imagem)

Além disso, manter o contato com a sua família ajuda o velocista a ter foco antes de entrar nas pistas e buscar superar seus limites. 

“Pergunto como estão as coisas, falo com meu pai e com minha mãe, falo com minha esposa, pergunto pelos meus animais, pelos meus bichinhos de estimação. Isso me deixa bem mais tranquilo. É uma forma meio que de esquecer o momento e concentrar ao mesmo tempo”, falou.

Novos desafios 

Petrúcio está em reta final de preparação para os Jogos Paralímpicos de Paris 2024. Antes de viajar à capital francesa, ele ainda vai disputar o Mundial no Japão. 

Nas Paralimpíadas, além de buscar o tricampeonato na prova dos 100m, o paraibano quer fazer história também na prova dos 400m, onde ele já conquistou uma medalha de prata no Rio e uma de bronze em Tóquio.

Petrúcio Ferreira durante a prova dos 400m T47 nos Jogos Paralímpicos de Tóquio. (Foto: Takuma Matsushita/CPB)

“É um desafio que eu entrei. Correr os 400m não é minha especialidade, as minhas especialidades são as provas dos 100 e 200 metros. Mas sempre buscando desafios que eu acho muito legal”, finalizou.

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