Professor Trindade
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João Trindade é cronista esportivo, com larga experiência. Foi auditor do Tribunal de Justiça Desportiva da Paraíba.

Controvérsias sobre a legitimidade da CAS
7 de agosto de 2024


Ultimamente, tem-se questionado muito a legitimidade da CAS (Corte Arbitral do Esporte) e o papel dela (ou dele, já que também é chamado Tribunal Arbitral do Esporte) no sistema de resolução de conflitos desportivos e se a Corte é, realmente, o órgão apropriado para se apelar das decisões institucionais do futebol.

A nossa Constituição Federal, no artigo 217, prevê que o recurso ao poder judiciário sobre ações relativas à disciplina e às competições desportivas só é possível quando esgotarem-se todas as instâncias da Justiça Desportiva.

Mas a questão é: Quando, de fato, são esgotadas as instâncias da justiça desportiva? Como os estatutos das entidades de administração do desporto preveem recurso à CAS das decisões do pleno do STJD, as instâncias da justiça desportivas não se esgotariam, evidentemente, nos tribunais nacionais. A previsão na Lei Pelé (Lei 9.615/98) de observância às normas internacionais referentes ao desporto ratifica esse argumento.

Conheça a CAS

Conhecida como a Suprema Corte do Desporto, a Court of Arbitration for Sports (CAS) ou, como também é chamada, Tribunal Arbitral du Sport (TAS) é uma instituição independente de qualquer organismo desportivo, sendo o órgão responsável pela resolução de litígios relacionados ao desporto, por meio de arbitragem e mediação.

Com sede em Lausanne, Suíça, a CAS iniciou as atividades em 30 de junho de 1984. O primeiro caso submetido ao Tribunal foi em 1986, com sentença proferida no ano posterior.

Quando foi criada, a CAS era controlada e financiada pelo COI – Comitê Olímpico Internacional, sendo essa entidade a única com poder de revisão dos estatutos da Corte.

O Tribunal Federal da Suíça já ratificou que o órgão possui todas as características necessárias para ser considerado um tribunal arbitral, nos termos da Convenção de Nova Iorque, mas questiona o relacionamento entre a CAS e o COI.

Devido a esse questionamento, em 1994 foi criado o Conselho Internacional de Arbitragem Desportiva (ICAS), passando a CAS a ter uma nova estrutura, tendo o ICAS como órgão supremo. O ICAS ficou, a partir de então, responsável por zelar pelo bom funcionamento e financiamento da CAS, substituindo o COI. O ICAS é composto por 20 membros, familiarizados não só com questões relativas à matéria, mas, também, com questões arbitrais.

Nesse mesmo ano, houve a criação do Código de Arbitragem da CAS que, entre outros, realizou uma mudança significativa no processo contencioso, subdividindo-o em uma via ordinária e uma via recursal (de apelação). Passou-se, então, a distinguir os casos de única instância e os decorrentes de decisões de outro organismo desportivo.

Sede do Tribunal Arbitral do Esporte (Foto: Divulgação)

O Código de Arbitragem do CAS é composto de 70 artigos, subdivididos em duas seções: uma, referente aos estatutos dos órgãos de resolução de conflitos relacionados com o desporto (artigos S1 a S26) e outra referente às disposições processuais (artigos R27 a R70). Os quatro processos especificados pelo Código de Arbitragem do órgão são: (1) a arbitragem ordinária; (2) a arbitragem pela via recursal; (3) o processo consultivo (não-contencioso, que permite a determinados organismos consultar as opiniões do CAS), e; (4) a mediação.

É importante lembrar que a CAS só pode ser acionada se as partes acordarem em referir litígios relacionados, de alguma forma, ao esporte para o Tribunal. Essa referência pode ser proveniente de cláusula inserida em contrato, regulamentos ou acordos celebrados entre as partes, posteriormente, no caso dos procedimentos de competência original da CAS (procedimentos ordinários). Havendo apelações, em face de decisões proferidas por federações, associações ou qualquer outra entidade com conexão com o esporte, essas devem ter especificadas, em estatuto ou regulamento, a competência recursal da CAS. No caso da FIFA, esse reconhecimento da jurisdição do referido Tribunal só ocorreu em 2002. Atualmente, as arbitragens envolvendo membros da “Família FIFA” representam 75% de todo o volume de disputas analisadas pela CAS na última década.

Sendo a mais alta instância no mundo desportivo e pela competência em dirimir conflitos desse universo, a CAS introduziu neles princípios característicos do Direito público: o devido processo legal, a igualdade de tratamento entre as partes e a
motivação das suas decisões.

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